sábado, abril 21, 2007

Pre-estréia: Wood & Stock: Sexo, Orégano e Rock'n'Roll (Idem, Otto Guerra, 2006)

O cartaz

Já aviso a quem for ler: meu interesse por quadrinhos nacionais é quase nulo. E não me venham com essa baboseira de "colonizado" e argumentos mequetrefes do gênero. Quando vejo alguém dizer que "Angeli é deus" sinto até uma dor no coração. Respeito o trabalho não só dele, mas dessa geração toda, mas exclusivamente pela autenticidade, pois a exploração do potencial do meio HQ que esses caras fazem é quase zero. O Angeli tem umas coisas engraçadas, o Gonsales idem. O Laerte não se encaixa muito nisso que eu tô dizendo (a série dos palhaços mudos é foda), mas de maneira geral, os trabalho desse pessoal não me apetece. Dizer que qualquer autor nacional, especificamente de humor, é gênio, é colocar autores que utilizam os quadrinhos de maneira mais interessante num patamar um pouquinho mais alto da grande consciência cósmica que organiza o universo. Roteiristas? Alan Moore, J M DeMatteis, Garth Ennis, Warren Ellis, Neil Gaiman, Jodorowsky. Artistas? John J Muth, Dave Gibbons, Bernie Wrightson, Bill Sienckewicz. Ah, a gente tá falando de tirinhas? Bill Waterson, Charles Schulz, Jim Davis. Não tem jeito. Tem gente demais usando os quadrinhos de forma mais criativa e mais interessante do que ficar fazendo piadas internas de grupelhos oitentistas pra eu levar a produção nacional a sério.

Enfim, fui à pré-estréia do filme aqui em Goiânia, que ocorreu com uns bons cinco ou seis meses de atraso em relação a São Paulo. "Poucas cópias" disse o diretor Otto Guerra. Vá lá. E aqui, abro, pra fechar logo ali, parênteses pra dar os parabéns à organização do evento, que mostrou pra quem quisesse ver como desorganizar a coisa. Mais de uma hora de atraso, falta de filas, gente demais. Era o inferno na terra. Pra piorar, a grande multidão se comportava como um bando de animais, furando o esboço de fila que tentava em vão se formar. Não conseguia parar de pensar que se tivesse custado um mísero real - era de graça -, a quantidade de pessoas ia ser menor do que a metade, e a coisa toda teria sido muito menos desgastante.

Depois de passar pela provação que foi a espera, começa o filme. Eu já não esperava muito, pela antipatia que sinto por esse tipo de material, mas o resultado conseguiu ser muito pior do que eu havia imaginado. Um monte de piadas jogadas ao acaso, de maneira ruim, com tirinhas sendo transcritas na íntegra e uma total falta de timing, de narração, de bom senso. Me pergunto o que o diretor fazia enquanto a equipe (que decididamente não é a melhor do mundo) estava jogando a sombra de roteiro no computador. Porque direção não há. Sem contar a dublagem porca, piorada pelos previsíveis jabás, como a Rita Lee fazendo a voz da Rê Bordosa.

A história é sobre os anacrônicos hippies Woody e Stock tentando formar novamente a banda que tinham na década de setenta, mas é também sobre a Rê Bordosa e suas façanhas etílicas, e também sobre os conflitos entre pais e filhos, e também sobre os conflitos matrimoniais e, enfim, não é sobre nada. Todos os ingredientes são batidos no liquidificador (com pinga vagabunda) e o resultado não podia ser pior. O filme não decide se vai falar abertamente de drogas ou não, se vai dar uma lição de moral no final ou não, se vai chegar a algum lugar ou não. Em alguns momentos, a sensação é de estar assistindo a uma daquelas animações que o Maurício de Souza fazia no final da década de oitenta, e que eram ruins de doer. Reza a lenda que Wood & Stock levou dez anos da concepção ao produto final, mas eu não acredito nisso. Como levaram dez anos pra terminar aquilo? O Kurosawa - e a comparação é válida sim, já que estamos falando de cinema -, escrevia roteiros inteiros em um único dia. E isso na época em que ele fazia filmes de baixíssimo orçamento, e no entanto veja só onde ele foi parar - um dos mais geniais autores de cinema de todos os tempos.

E a qualidade da animação? Como eles conseguiram manter o nível tão baixo durante os 81 minutos de exibição? Porque meios de obter melhor resultado certamente existem, com softwares por aí que qualquer moleque usa de maneira muito mais eficiente, sem contar que animadores fazendo trabalhos (muito melhores) no braço existem desde a década de vinte. Os movimentos são cortados de maneira incômoda, a dublagem não bate com nada, e a emulação do desenho do Angeli definitivamente não funciona a 24 quadros por segundo. Nada ali funciona. É tudo muito, muito ruim mesmo. Não valeu a espera. Pra não dizer que foram horas completamente desperdiçadas, foi legal falar mal depois com a minha parceira no crime.

Me incomoda essa história de valorizar porque é nacional, valorizar porque é do Angeli, valorizar porque é humor. Valorizar besteiras como essa tende a nivelar sempre por baixo os trabalhos desse tipo que possam vir a surgir no país. Isso acontece nos quadrinhos, acontece no cinema e tudo indica que vai acontecer também na já defasada indústria da animação nacional.

A quem interessar possa, dêem uma olhada aí embaixo. Essa foi votada a melhor animação de todos os tempos por 1000 membros da indústria da animação em 1994, e foi produzida em 1957. Alguns podem dizer "Mas é de um grande estúdio". Vale lembrar que na época tudo era feito à mão, e se a tecnologia dessa indústria ainda não avançou o suficiente pra simplificar o processo e substituir os grandes investimentos, animadores brasileiros, por favor voltem a fazer tudo à mão.


4 comentários:

  1. Amanhã vou colocar meu comentário sobre o filme no lupevision (e me preparar para possíves reclamações...), e um link pra sua resenha... Gostei da maneira como você colocou a questão, e mesmo deixando claro que não gosta de quadrinhos brasileiros de humor não ficou parecendo q isso contaminou sua opinião. Muito bom.
    =*

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  2. http://www.adultswim.com/shows/athf/movie/index.html

    olha isso cara!

    ALbpunk is not Death!

    Abraço Fessor!

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  3. o problema dos quadrinistas mais famosos do brasil é que eles ainda sao brasileiros
    "jeitinho brasileiro" não cola
    hehe

    parabens pelo blog
    mui bom!

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  4. heauhauehua
    fiquei curioso pra ver só pela tosqueira do filme!

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